“...Lá fora uma chuva fina que cai, aqui dentro um friozinho que não consigo perceber se é a ação do tempo, ou das lembranças que me vêem a cabeça. Antigamente tudo era perfeito...
O relógio despertava naquela mesma horinha de sempre, eu levantava pensando comigo, como seria o dia. Passava uma água no rosto, uma escova nos dentes, enquanto isso a chaleira chiando avisava que estava na hora do café. Quando eu pensava em tomar um gole de café, já estava na hora de sair correndo para não perder a hora.
Chegava ao trabalho, trocava de roupa e ia trabalhar. Eu achava engraçado como aqueles caras amarrados com aqueles couros, óculos, capacetes, enfim aquelas coisas que eles chamavam de EPI. Eu pensava comigo ‘que bando de puxa-sacos, ficam trabalhando com essas coisas só para se mostrar’. Eu pensava que eu é que estava certo, trabalhava sem usar aquelas coisas de nome engraçado: EPI, que coisa mais ridícula. Eu conseguia fazer tudo o que eles faziam, e se fosse olhar bem, eu fazia melhor ainda, porque eu não perdia tempo com aquelas besteiras.
Um dia, um cara metido a besta veio falar comigo e perguntou porque eu não usava os tais EPI’s. Eu, dono da situação como sempre, respondi a ele que não havia necessidade de tanta frescura pois o trabalho que estava executando era moleza. Foi aí que ele me disse que era Técnico de Segurança . Pensei comigo, grande coisa, só que fiquei na minha, pois sabia que ele até podia me prejudicar. Fiz de conta que ouvi e concordei com ele. Depois fiquei pensando comigo: 'pôxa, essa empresa contrata cada um’.
Um dia após o outro foi passando e eu trabalhando da mesma maneira. De vez em quando, vinha aquele tal técnico conversar comigo e eu esperto que era, fazia de conta que estava de acordo com tudo o que ele falava. Havia uns caras também, que eu achava o maior absurdo, só porque faziam parte de uma tal de CIPA, se achavam no direito de vir me encher a paciência para usar o tal de EPI. Eu, muito esperto, achava um jeito de me livrar daquela ladainha, quase todo dia vinha alguém me dar conselhos. Um dia me convidaram para participar de uma reunião da CIPA. Eu fui porque sabia que era obrigado a ir, mas cheguei lá e me livrei brincando, pois só disse que iria trabalhar equipado e me deixaram em paz.
Agora notei que a chuva lá fora aumentou e também o frio aqui dentro, mas as lembranças tornam-se mais amargas. Eu lembro que naquele dia tudo corria bem. Eu esperto como sempre, trabalhava sem perder tempo com besteiras, desempenhava meu trabalho com a maior rapidez, olhava de um lado e lá estava um babaca perdendo tempo com o tal de EPI; olhava do outro e lá estava outro querendo se mostrar também, enquanto os outros não tinham começado ainda. Foi em um desses momentos em que eu estava reparando nos outros que aconteceu... Ouvi aquele barulho, e já em seguida senti uma dor aguda, foi quando perdi os sentidos. Acordei, estava num leito de hospital, e olhando ao redor reparei que estava acompanhado dos familiares, olhando o semblante de um por um, percebi que estavam tristes. Fiquei curioso e preocupado ao mesmo tempo. Por que todos estão tristes? Foi quando me disseram que eu estava inválido e que não poderia mais trabalhar. Confesso que tive a impressão que o mundo havia desabado sobre mim. Uma névoa sobre meus olhos pairou e de repente comecei a perceber nitidamente o quanto estava errado. Se tivesse ouvido aqueles que me alertaram, se eu tivesse perdido um pouco de tempo com os EPI’s, eu não estaria aqui neste momento sem poder produzir nada... eu não vou contar como foi meu acidente em detalhes porque hoje eu sei que todo tipo de Equipamento de Proteção Individual é importante, e a falta de qualquer um deles pode deixar uma pessoa inválida.
... Lá fora a chuva parou, mas eu vou ficar aqui sofrendo este frio de arrependimento, pois não posso me levantar para aproveitar a melhora do tempo...”
Um comentário:
Não sei se a história acima é real ou não, mas posso garantir que pessoas que agem da maneira que agia o personagem acima ainda existem por aí. Antigamente davam muita trabalho nós, profissionais da prevenção. Hoje melhorou muito e o nível de conscientização está bem maior, mas ainda tem pessoas que acham que somos os chatos que ficam vigiando os outros trabalhadores só para pegá-los fazendo coisa errada. Infelizmente não são poucos aqueles que sofrem por não terem aceitados nossas orientações e, sem hipocrisia, nós sofremos também por não ter conseguido convencê-los a usar os equipamentos de proteção.
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